domingo, 22 de fevereiro de 2009

ANTÔNIO.

É num dia como esses que me lembro do Antônio. E curiosamente lembrei de um fato que ocorreu faz dois anos. Antônio estava entediado com a vida, mas principalmente com o seu trabalho. Um lugarzinho medíocre, repleto de pessoas medíocres, fazendo coisas – não por acaso – medíocres. Gentinha rasteira, infeliz.
Antônio era um homem simples, muito sensível, próximo das artes nobres. Mas a objetividade da vida o obrigou a trabalhar em um lugar qualquer para ganhar um dinheirinho, com dizia sua mãe. Dinheirinho ordinário que custava a paciência do meu amigo.
Só o tesão que sentia pelas coxas de Lúcia melhorava o seu dia. Lúcia e Antônio estavam namorando há um ano. Ela era cabeleireira, mas queria ser atriz e não era exatamente bonita. Mas Antônio adorava suas coxas e também o jeito como mexia a boca, quando falava. Outra coisa que o fazia feliz eram as poesias de Mário de Sá Carneiro. Antônio sabia todas e costumava declamar em voz alta, sozinho, no seu quarto.
Um dia ele chegou no limite e decidiu não ir trabalhar. Que se dane o filho da puta, pensou. E saiu com o seu fusca velho, enferrujado. Soube que levou algumas roupas, livros, discos de Beethoven. E Lúcia, é claro.
Antes de ir embora ele deixou uma carta aqui em casa, contando tudo isso. Nunca mais tive notícias dele. Quem sabe um dia mande um telegrama. Espero que esteja tudo em ordem. Ele merece.